Apuramento da verdade
O objectivo do programa de apuramento da verdade consistia em documentar violações de direitos humanos cometidas por todas as partes envolvidas no conflito político entre Abril de 1974 e Outubro de 1999. As estratégias adoptadas foram a recolha sistemática de testemunhos em cada subdistrito, a investigação focalizada e a realização de audiências públicas. Foi procurada documentação de fontes em Timor-Leste e no estrangeiro, incluindo documentos e outros materiais relevantes.
A Comissão reuniu 7.669 testemunhos dos 13 distritos e 65 subdistritos de Timor-Leste.* A Comissão trabalhou em conjunto com uma coligação de organizações não governamentais de Timor Ocidental para dar aos timorenses de leste residentes em Timor Ocidental a oportunidade de prestarem testemunho. Entre Fevereiro e Agosto de 2003, a coligação de ONG reuniu, em nome da Comissão, um total de 91 testemunhos de timorenses de leste residentes nas regiões das cidades de Belu, Kefamenanu, Soe e Kupang, em Timor Ocidental.
A Unidade de Investigação da Comissão realizou mais de 1.000 entrevistas centradas nos seguintes temas: fome e deslocação, forças de segurança indonésias, Fretilin/Falintil, prisão e tortura, mortes extrajudiciais e desaparecimentos forçados, crianças, mulheres e conflito interno armado.
Os entrevistados incluíam pessoas que tinham interpretado papéis significativos em acontecimentos e que tinham ocupado cargos de liderança em várias fases do conflito, bem como perpetradores e vítimas. Comissários e funcionários conduziram estas entrevistas em Díli, nos distritos, em Portugal e na Indonésia. Os temas de investigação correspondiam, de uma maneira geral, aos temas das audiências públicas nacionais e os investigadores também interpretaram um papel importante na identificação e no estabelecimento do contacto com as vítimas e testemunhas que depuseram durante estas audiências. Em meados de 2003, a Comissão iniciou várias entrevistas com figuras-chave nacionais, conhecidas como entrevistas VIP. Além de fornecerem um testemunho pessoal da experiência directa, estas entrevistas permitiram à Comissão investigar antecedentes e detalhes de organizações e acontecimentos. A Comissão realizou 15 entrevistas VIP, em Timor-Leste e na Indonésia, incluindo Timor Ocidental.
Em Junho de 2003, a Comissão conduziu um inquérito estatístico sobre o número de timorenses cuja morte resultou directamente do conflito, de privação, de combate armado, de fogo cruzado, de morte ilícita ou de desaparecimento forçado. Embora tenham sido feitas várias tentativas no passado para calcular o número de mortes devido a estas causas, esta foi a primeira oportunidade que qualquer organização teve de proceder a uma investigação objectiva sobre o número de mortes ocorridas durante o conflito.
Este projecto foi delineado e implementado em colaboração com o Grupo de Análise de Dados sobre Direitos Humanos (HRDAG), uma organização internacional especializada em análise estatística de direitos humanos e que tem trabalhado nesta área juntamente com várias outras comissões de verdade. A análise foi baseada em três conjuntos de dados independentes:
- A informação contida nos quase 8.000 testemunhos recolhidos, codificados e introduzidos na base de dados da Comissão.
- O Recenseamento de Cemitérios baseado na contagem de lápides num total de 492 cemitérios em Timor-Leste.
- O Estudo Retrospectivo da Mortalidade, concebido pelo Grupo de Análise de Dados sobre Direitos Humanos. Foi realizado um levantamento intensivo entre 1.322 agregados familiares seleccionados aleatoriamente, em 121 pequenas aldeias distribuídas pelo território, que incluía um questionário elaborado para gerar informação relacionada com o número de mortes, como datas, circunstâncias e causas de morte de membros da família durante o período do conflito.
A aplicação de técnicas estatísticas a estes conjuntos díspares de dados, cada um com os seus pontos fortes e fracos, conseguiu produzir uma estimativa cientificamente válida do número de mortes.
* Embora o Plano de Desenvolvimento Nacional de Timor-Leste mencione 67 subdistritos no país, quando a CAVR foi formada, antes da independência, havia 65 subdistritos geralmente aceites, que constituíram a base das estratégias operacionais da Comissão. As equipas da Comissão recolheram um total de 7.824 testemunhos, embora alguns destes (155 testemunhos) não fossem introduzidos na Base de Dados de Violações dos Direitos Humanos (HRVD) para afeitos de análise quantitativa, porque ou não referiam violações relacionadas com o mandato da Comissão, ou as violações mencionadas não se enquadravam no período do mandato da Comissão: introduziu-se na HRVD da Comissão um total de 7.669 testemunhos.